Meu Pitaco

Saturday, February 17, 2007

João Hélio

Meus imensos respeitos à família de João Hélio, o garoto morto por assaltantes. A morte do menino infelizmente traz à tona mais uma vez um problema mais do que debatido, a violência. Mas acima da violência, acho importante tentar pensar os detalhes em volta desse crime que as pessoas tanto comentam.

A Polícia Federal começou a pegar pesado com o tráfico e a venda de drogas ficou mais difícil. O acesso às favelas também mudou de cara, já que, em algumas comunidades, o que se vê agora são milícias formadas principalmente por ex-policiais que vêm se mostrando quase tão fortes e corruptas quanto os antigos "donos" das favelas. A juventude passou a consumir mais drogas sintéticas e o interesse pelas drogas tradicionais (maconha, cocaína etc.) caiu. Todos esses fatores fizeram crescer o número de assaltos, numa busca desenfreada por reduzir o prejuízo. A Polícia Militar, tão criticada e odiada por muita gente, está trabalhando mais. Muitos criminosos são presos, mas a justiça permite que eles voltem pras ruas e o trabalho dos PMs fica sendo em vão.

E o que isso tem a ver com o caso do menino João Hélio? Quase tudo.

Este caso foi apenas uma prova do que acontece todos os dias com cidadãos como ele, eu, ou qualquer um. Estamos à mercê de um estado que não nos garante os direitos básicos democráticos. Isso faz não só com que o assaltante tenha a velha desculpa de não ter tido oportunidade de estudar quando novo, mas com que nós não consideremos o morador da comunidade um cidadão de verdade. Enrolado, não? Espero que faça sentido no final.

O que será que nos choca nesse crime em específico? A crueldade de saber que uma criança foi arrastada por 7 quilômetros com sua cabeça sendo arrastada no chão? Sim, com certeza! Mas será apenas isso? Qual a diferença de sabermos que isso aconteceu pra sabermos que provavelmente todos os dias algumas pessoas são devidamente tostadas no microondas? (Pra quem não sabe, os traficantes cariocas inventaram o microondas, uma forma de matar alguém sem deixar muitos vestígios. O sujeito é todo envolvido em pneus, ficando coberto até a cabeça. Logo após é besuntado com gasolina ou qualquer outro líquido inflamável e é ateado fogo para que a pessoa não só morra como também não se tenha a desconfiança de que alguém vai achar o
corpo.)

Alguns hão de falar que a diferença é que o garoto tinha 6 anos e era totalmente inocente e no caso do microondas geralmente se faz isso com bandidos de facções rivais. Concordo também. Mas o que nos faz termos tão pouca preocupação pelos crimes que acontecem com meros figurantes de favelas no Rio e mais preocupação com os casos que ocorrem perto de nós? A real
possibilidade de acontecer conosco também. E quem consegue nos empurrar isso goela adentro? A imprensa!

A imprensa teria, como um de seus papéis, o dever de denunciar impunidades e NADA faz em relação aos crimes diários acontecidos nas comunidades carentes do Rio. Não me surpreende que o "favelado" tenha raiva de qualquer coisa que o pareça vir "do asfalto". A vida toda ele precisou de hospitais, escolas, saneamento básico... Ou seja, atenção! E isso tudo só é garantido aos que no asfalto moram. Ao resto o esquecimento. O menino João Hélio foi vítima não só da violência que assola o mundo inteiro, mas também da omissão do governo quanto às comunidades carentes. Enquanto os pobres forem tratados como coisa, eles viverão como se a vida não tivesse valor. Onde a cabeça de uma criança roçando no chão não significa nada, apenas algo que está no caminho. Assim como nós tratamos os moradores de comunidade: coisa.

Enquanto não os dermos valor, eles não nos darão valor. Enquanto os deixarmos morrer, eles nos deixarão morrer.

0 Comments:

Post a Comment

<< Home